sexta-feira, 3 de janeiro de 2020

Monster - Capítulo 1

Conheça o Charmoso

“O primeiro super-herói não foi super homem,”
Malik Tenerife falou para Shade Darby. “foi. Tipo, quatrocentos mil anos atrás. Super forte, super inteligente, imbatível nas batalhas." Ele levantou o dedo para cada observação. “Nome Gil, sobrenome Gamesh?” “Muito engraçado, Shade. Tenho certeza que fizeram essa piada quatrocentos mil anos atrás. Gilgamesh, bebê: o primeiro super-herói.” “Não vamos considerar Jeová?” “Acho que deuses não contam como heróis,” Malik falou. “Mmmm. Eles contam se não forem deuses reais,” Shade rebateu. “Quero dizer, mulher maravilha é uma Amazona, Thor é um dos deuses de Asgard, e Tempestade não era um tipo de deusa Africana?” Malik balançou a cabeça e negação. “Sabe, eu meio que odeio quando você faz isso.” “Faço o que?” A expressão inocente dela não era convincente, e ela não queria que fosse. “Quando você pretende não saber um assunto e então despeja conhecimento sobre quando debatemos.” Para um garoto que estava bravo, ele estava sorrindo bastante. Shade sorriu, algo que ela raramente fazia. “Mas é tão engraçado.” Ele parou de sorrir e ele se inclinou sobre a mesa. “Você realmente vai fazer isso, Shade? Você sabe que isso é um crime, certo? Crime federal? Pior, é algo que só o governo cuida.” Shade balançou a cabeça em afirmação. Eles estavam em uma Starbucks na avenida Dempster, em Evanston, Illinois. Estava lotada, com seus clientes da manhã—estudantes, mães, duas mulheres com roupas neon de trabalhadores de estrada, estudantes de faculdade, como Malik, todos tomando o seu café. Estava barulhento o suficiente para que eles pudessem conversar sem se preocupar de alguém prestar atenção, mas Shade falou para Malik não usar a palavra "crime" mesmo assim, porque esse é o tipo de palavra que atraí a atenção das pessoas. Eles beberam seus cafés—Puro para Malik, Capputino para Shade— olharam o relógio e saíram. Malik era um menino negro alto, dezessete anos, cabelos cacheados e algumas mechas caíam sobre os olhos deles, um charme que ele tinha consciência sobre. Os olhos sempre davam a impressão de que ele estava pensando em algo inteligente. Sua expressão era sempre de desacreditado, mas estava disposto a debater. 
Shade era uma garota de dezessete anos, branca, com o cabelo comprido, sem corte definido, o que fazia as pessoas acreditarem que ela xingava, fumava maconha e se metia em problemas. Apenas duas dessas coisas eram verdade. Ela tinha olhos castanhos que podiam variar de curiosos para infantil e inocente—ela sabia usar muito bem esses olhares. Ela era alta, 1.70, e tinha uma estrutura óssea que fazia as pessoas dizerem, "Ei, você devia ser modelo," mas por causa da cicatriz embaixo do queixo até embaixo da orelha, ela só conseguiria trabalho em um filme pirata, ela seria natural nisso. Shade era carismática por natureza, com um senso de perigo, mesmo com tudo isso, Shade não era popular na escola. Ela era muito focada nos livros, muito consciente, impaciente, sempre fazia questão de mostrar que era mais inteligente do que outras pessoas. E além de tudo isso, havia algo em Shade, algo estranho, sério, sinistro; e até perigoso. Malik sabia de onde aquela sensação vinha: Shade era fissurada. Como alguém viciado em algum vídeo game, mas o vício dela era algo que realmente aconteceu, algo que envolvia medo, morte e culpa. E não era nenhum jogo. Estava frio na rua, não muito frio, mas o suficiente para pessoas cruzarem os braços e narize serem assoados. A Starbucks era no norte da avenida Hinman, onde Shade morava, era uma rua cheia de casas com aparência vitoriana com cercas baixas, gramados e árvores que já haviam perdido muitas folhas. Shade e Malik andaram juntos pela rua onde o ponto de ônibus estava. Já haviam seis crianças ali “Bem, eu te vejo por aí, Shade,” Malik falou. Havia algo estranho no tom que ele usou para falar aquilo, tensão, preocupação. Shade percebeu isso e falou, “Pare de se preocupar comigo, Malik. Eu sei me cuidar." Ele riu. Ele tinha uma risada que parecia algum animal fazendo barulho. Shade sempre gostou disso nele: uma risada idiota de uma pessoa tão inteligente. Também gostava dos seus braços, seu peito, seus lábios e . . . Mas isso era passado agora. Eles eram apenas amigos agora. “Provavelmente não vai funcionar,” Malik falou. “Você está torcendo contra mim?” Shade perguntou. “Nunca.” Ele sorriu, colocou uma mão sobre o peito, algo que ele provavelmente viu em Game of Thrones. E funcionou, tudo o que Malik fazia, de algum jeito funcionava."Eu vou conseguir, Malik. Eu preciso." Malik suspirou. "Sim, Shade, eu sei. É chamado de fixação." "Achei que esse era o nome de um perfume," ela brincou, sem esperar risadas e recebeu um olhar sério de Malik. "Você sabe que pode sempre me ligar, certo?" Shade levantou o seu copo e brindou com o de Malik. "Você não deveria dar em cima de garotas no ensino médio," ela falou. "Que escolha eu tenho? Garotas da faculdade sabem que conseguem coisa melhor do que eu," ele falou e começou a ir, andando de costas para ela, em direção ao Campus que ficava alguns quarteirões para o norte. "E você vai ser uma garota da faculdade ano que vem." Ele era seis meses mais velho que ela, sempre um ano a frente. "E também, Sandman não era basicamente um deus…," Shade gritou. "Não estou te escutando," Malik falou e cobriu suas orelhas. "o que dissa? Lalalalala. Mas o foco se Shade já havia mudado para um garoto novo no ponto de ônibus. Um garoto Latino, ela chutou. Alto. 1.74, bonito. Espere. Não. Talvez não era um garoto, exatamente. Interessante. Ele ou possivelmente ela parecia nervoso, o aluno novo. Seus olhos escuros estavam em alerta, e maquiados com um lápis de olho. Os outro eram dois meninos do primeiro ano que pareciam era ter fugido do ensino fundamental; o garoto negro chamado Charles ou Chuck ou outro nome—ela não se lembrava—que ela nunca viu sem seu fone de ouvido; e dois meninos gigantes do time de futebol, um branco e um negro, nenhum dos dois tinha o que podia ser chamado de pescoço. “Isso vai ser um problema,” Shade murmurou. Os dois jogadores estavam encarando o aluno novo, com um ar de predadores. Ninguém falou com Shade quando ela se aproximou, mas não muito, apenas a distância que ela podia observar. Ela tomou um gole do seu café e esperou, observando os jogadores, os olhares entre eles, as piscadas. Ela conseguia cheirar a violência no ar, a testosterona, suor e pura agressividade animal. Ela percebeu também que o aluno novo estava ciente disso. Ela estava desviando o olhar e quando os jogadores pararam atrás dela, ela conseguia ver os pelos da sua nuca se arrepiando Evanston sempre foi uma cidade sem problemas de homofobia, mas uma pessoa gay, ou trans mais jogadores de futebol cheios de testosterona não eram uma boa mistura. "Ei, responde uma coisa para a gente," o jogador branco falou para o aluno novo. Shade viu que ele deu um pequeno pulo de susto, mas ele se recuperou rapidamente e encarou os jogadores. "Okay." Era uma voz feminina. Shade ficou surpresa. "O que é você?" Houve um segundo em que o aluno novo pensou em fugir. Ele até olhou para rua procurando uma rota de fuga. Mas ele não fugiu. "Meu nome é Cruz," o aluno novo falou. Ele estava com seu cabelo preto e longo solto, na altura dos ombros, jogado para um lado. Shade balançou a cabeça, imperceptível, assistindo, analisando. "Não perguntei o seu nome, perguntei o que você é." O jogador negro falou. "Sabe, eu ouvi dizer que você é doido. Que acha que é uma garota." Shade concordou, ah, então era isso. Shade estava aliviada por ter uma resposta. Ela nunca havia falado com uma pessoa trans antes, talvez ela devesse fazer um esforço para conhecer esse aluno novo—se ele sobrevivesse nós próximos minutos. Nota mental: ele ou ela? Shade ia perguntar para Cruz qual era melhor. E decidiu usar pronomes femininos no seu diálogo mental. Não que seu diálogo mental, ou sua escolhas de pronomes fossem ajudar a aluna nova que estava claramente em apuros. Cruz lambeu os lábios, olhou para rua e suspirou em alívio: o ônibus escolar estava chegando. Trinta segundos. Shade percebeu que Cruz achou que estava salva, mas Shade não tinha certeza disso. "Eu não acho que sou uma menina nem um menino, eu sou apenas eu," Cruz falou. Havia um tom de desafio ali e alguma coragem. Cruz não era pequena ou fraca, mas comparada aos jogadores de futebol, ela era as duas coisas. "Ou você têm um pinto ou você não tem." O braco falou. Claramente um futuro filósofo. Shade achava que seu nome era Gary, Gary? Greg? Alguma coisa com "G." "Você está muito interessado no que eu guardo dentro da calça," Cruz falou. Shade de contratiu."E aqui vamos nós," ela murmurou. O ônibus estava parando. Quando o garoto negro (que Shade achava que seu nome era Griffin… ou ela estava confusos os nomes?) Que empurrou Cruz na lateral do ônibus. Cruz perdeu o equilíbrio, começou a cair e demorou muito tempo para tentar parar a queda com as mãos, o choque entre o ônibus e ela foi forte, ela caiu de joelhos no chão. O ônibus parou, as portas se abriram e o motorista apenas falou, "Vamos entrando,pessoal." Os outros garotos entraram as pressas. "Tem uma criança machucada aqui," Shade falou para o motorista."Bem, fale para ele subir no ônibus para que ele possa ver a enfermeira da escola." "Eu não acho que ela consegue subir," Shade falou. Cruz se sentou no meio fio. Sangue saindo do nariz e lágrimas escorrendo pelo rosto. Não pense em um rosto coberto de sangue. Não volte para aquele lugar. Shade tomou uma decisão rápida, uma decisão por instinto. "Pode ir, estou de atestado hoje," Shade falou para o motorista. O ônibus saiu a toda velocidade. "Ei," Shade falou. "Quer que eu chame a ambulância?" Cruz balançou a cabeça. Ela estava tentando recuperar o fôlego entre o choro. "Vem comigo, vou te dar alguns Band-Aids." Cruz se levantou quase completamente antes de cair, quando sentiu uma dor no tornozelo. "Pode ir, eu vou ficar bem," Cruz falou. "Não é minha primeira surra." Shade riu de nervoso. "É, você parece ótima, vamos, coloque seu braço sobre meus ombros. Eu sou mais forte do que pareço." Pela primeira vez as duas fizeram contato visual, Cruz com lágrimas e furiosa, machucada, olhos castanhos expressivos e Shade com um olhar curioso. "Eu moro descendo a rua. Você não consegue andar, está com o rosto coberto de sangue. Então ou me deixa ligar para a ambulância ou vem comigo." Shade falou com um tom de voz neutro e amigável, mas firme o suficiente para ela não negar, como se estivesse falando com uma criança ou um cachorro. Elas quase caíram algumas vezes durante o caminho—Cruz precisou se apoiar de verdade em Shade—mas no fim elas conseguiram chegar, deram a volta na casa e chegaram na porta dos fundos. Elas entraram pela cozinha, uma cozinha normal para uma vizinhança normal. Shade pegou um saco, encheu de gelo e deu para Cruz. "Vamos." Elas subiram as escadas, Cruz se apoiando no corrimão da escada e Cruz logo atrás caso ela caísse para trás. O quarto de Shade ficava no segundo andar, paredes amarelas. Uma cama de casal com um cobertor branco. Uma mesa de estudos. E os livros, muitos livros, prateleiras cobrindo quase toda a extensão da parede, uma pilha perto das janelas, uma na cadeira e uma no cômodo ao lado da cama. Shade tirou os livros do caminho para que Cruz pudesse sentar na cadeira. Shade foi rapidamente ao banheiro e voltou com uma garrafa de álcool, panos e uma caixa de Band-Aids. "Coloque sua perna na cama," Shade instruiu. Cruz segiu as instruções e Shade colocou a bolsa de gelo no tornozelo dela. "Tome isso. ibuprofeno: vai amenizar a dor." "Você está sendo muito legal," Cruz falou. "Você nem me conhece." "Hmm, sim, é isso que todo mundo diz sobre mim," Shade falou brincando. "Que eu sou muito legal." Cruz limpou o sangue cuidadosamente usando o celular como espelho. Então, como se tivesse acabado de lembrar, pegou um pequeno caderno roxo da bolsa, estava amassado, mas nenhum outro dano. Cruz colocou de volta na bolsa, aliviada enquanto Shade colocava os lenços sujos de sangue no lixo. "Shade Darby, aliás. Esse é meu nome." "Nome legal." "Tem algo a ver com o momento que fui concebida. Surpeito que haviam árvores. Mas nunca tive coragem de perguntar detalhes. E você é a Cruz." Cruz concordou. "Caso esteja imaginando, eu tenho um pinto." Shade riu daquilo, o que fez Cruz rir de vergonha. "Essa é uma condição permanente? Shade perguntou. Cruz se encolheu. "Eu não tenho uma resposta curta." "Eu tenho tempo. Te aviso caso fique chato." Ela se sentou na cama. "Okay. Bem… você sabe que é tudo um spectrum, certo? Quero dizer, existem pessoas—grande maioria—que nascem ou H ou M e eles estão felizes com isso. E existem pessoas que nascem em um corpo, mas com uma mente completamente diferente, entende? Eles sabem, desde criança que estão no corpo errado. Eu, bem… meio que nenhum. Ou os dois. Ou algo." "Você é todas as opções acima. Você é múltipla escolha, mas em um teste de verdadeiro ou falso." Cruz emitiu um pequeno som de desconforto. "Posso usar essa frase?" "Eu entendo Spectra. E entendo que sexualidade e gênero são coisas diferentes," Shade falou e se levantou. "Isso aqui não é Alabama, no fim das contas. Ou não era. Nossa aula de educação sexual não termina em Adão e Eva." "Você não é… normal," Cruz falou. "Hmmm," Shade respondeu. "Eu gosto de garotos a maior parte do tempo." Cruz respondeu tímida.  "Se isso ajuda a explicar as coisas. "Eu também." Shade falou. E então adicionou, "Em teoria. Não sempre na prática." Cruz a encarou. "Eu vi você com aquele garoto, alto, negro e charmoso." "Malik?" Shade não esperava aquilo. Ela não estava acostumada a ser observada. "Ele gosta de você." "Gostava, passado. Somos apenas amigos agora." Cruz balançou a cabeça. "Ele olhou três vezes para trás enquanto ia embora." "Então, você é uma garota hétero presa no corpo de um menino gay? Me conte detalhes." Shade falou para mudar de assunto e ela ficou aliviada em perceber que Cruz sabia o que estava fazendo. Esperta. Shade pensou. Esperta demais? Esperta o suficiente? "Eu sou múltipla escolha em um teste de verdadeiro ou falso." Cruz falou. "Você pode me citar nisso." "Pronomes?" "Mais ela do que ele, mas não me importo muito, mas se você puder…" Agora foi Cruz que mudou de assunto. "Você lê bastante." "Sim, mas só pra ficar mais popular." Shade não mudou o tom de voz o que deixou Cruz claramente confusa, até perceber que era uma piada. Cruz demorou alguns segundos, mais do que Shade ou Malik demorariam para perceber, mas ainda sim foi rápido. "Vou ligar para a escola falando que estamos doentes." Shade falou e discou o número no telefone. "Eu não acho que você pode fazer isso." "Por favor." Shade colocou o celular na orelha. "Oi, aqui é Shade Darby. EU estou me sentindo um pouco doente e também estou ligando para avisar que—" Ela cobriu o telefone e perguntou, "Qual o seu nome de registro?" "Hugo Cruz Martinez Rojas." "Hugo Rojas. É, ela está machucada. Alguns dos seus jogadores de futebol agrediram ela. Sim. Não. Uh-huh." Shade desligou. "Viu? Nenhum problema. A escola já está lidando com o incidente da swastika. Eles não querem mais problemas." "Swastika?" "Pintaram do lado do prédio, o de música. Uma swastika e algumas palavras de ódio, metade escrito errado. Muito triste quando alguém faz isso, mais triste quando não conseguem escrever direito." Cruz havia removido a maioria do sangue do seu rosto e pescoço, mas Shade pegou um lenço e insistiu em limpar onde Cruz não conseguiu chegar. O gesto deixou Cruz embaraçada, que se focou nos livros. “Veronica Rossi. Andrew Smith. Lindsay Cummings. Dashner. Marie Lu. Daniel Kraus.” Lendo os nomes dos autores nas lombadas. “And Dostoyevsky? Faulkner? Gertrude Stein? David Foster Wal-lace? Virginia Woolf?” “Meu gosto é eclético,” Shade falou. Ela esperou para ver o que Cruz ia falar da coleção dela. "A ciência da anomalia em Praia Perdida." Cruz ficou confusa. "Poder e Possibilidades: O Significado da Anomalia de Praia Perdida. Aquilo parecia dramático. A Física da Anomalia de Praia Perdida. Muita matemática para mim. Nossa História: Sobrevivendo ao LGAR. Esse eu li—acho que todo mundo leu. Eu não gostei do filme, eles claramente diminuíram muita coisa." "Você gosta muito de Praia Perdida." Shade concordou. "Alguns diriam que sou fixada." Alguns. Como Malik. "E você gosta de ciência." "Meu pai é professor na Northwestern, chefe do departamento de astrofísica. Coisa de família." "E sua mãe?" "Morreu." Shade se xingou na própria cabeça. Quatro anos falando isso e ainda não conseguia falar sem deixar a voz quebrar. "Sinto muito," Cruz falou. "Obrigado," Shade respondeu. Ela tinha a habilidade de colocar um grande fim da conversa em tópicos que ela não queria continuar falando, e Cruz pegou a deixa. "Meu pai é encanador," Cruz falou. "Nós morávamos em Skokie, mas eu tive problemas na escola. Era católica e acho que eles preferem que seus estudantes sejam meninos ou meninas e não todas as opções, ou nenhuma das opções. Eu comecei usando o uniforme dos meninos, mas enjoei e troquei para o das meninas e eles não gostaram quando coloquei uma saia." "Não?" "Era meio curta," Cruz falou brincando, "mas eles não fazem muitas saias de uniforme do meu tamanho." "O que você faz quando não está provando violência no ponto de ônibus?" Cruz tinha uma risada silenciosa, completamente o oposto de Malik. "Você quer saber o que pretendo fazer quando crescer? Esse é meu outro segredo. Eu consigo lidar com os problemas de gênero, mas escrever… Quero dizer, quando você diz que quer ser escritor, as pessoas rolam os olhos." "Vou garantir que você não está olhando quando rolar os meus," Shade prometeu. "Eu quero ser Veronica Roth quando crescer. Sabia que ela é daqui? Ela estudou na Northwestern." "Você escreve sobre o que?" Cruz ficou claramente desconfortável. "Eu não sei. É mais terapia, sabe? Trabalhando meus problemas, mas usando personagens que criei." "Não é isso que todos os escritores fazem?" Cruz deu uma risadinha. "Você… é interessante." Algo na maneira que Shade falou fez Cruz sorrir. Depois disso elas conversaram sobre livros, comeram salgadinho, beberam suco de laranja; elas assistiram um pouco de TV, Shade deixando Cruz escolher, porque, claro que Shade estava testando ela ou estudando ela. Cruz era realmente interessante. E. Útil? O dia foi passando e a dor no tornozelo de Cruz sumiu. No fim das contas, Shade decidiu que gostava dessa pessoa, dessa todas as opções acima. Essa pessoa que usou uma saia na escola católica, essa esperta, mas não muito esperta, engraçada, criatura frágil que queria ser escritora. Pessoa, Shade se lembrou. Não criatura, pessoa. Ela sabia que tinha tendência de analisar as pessoas com um olhar de cientista. Culpa da genética. Shade precisava de ajuda, suporte, ela sabia disso e sua única opção era Malik, que ia tentar atrasar e atrapalhar. Malik tinha um complexo de herói, um daqueles garotos—homem jovem, no caso do Malik—que achava seu dever parar qualquer ataque de bully. Se estivesse no ponto de ônibus, ele teria se jogado na frente de Cruz para salvá-lá e apanharia e seria o sangue dele que Shade estaria limpando agora, aqui no quarto dela… E esse não era um bom lugar para ir, Shade. Eles se aproximaram desde o começo, quatro anos atrás quando Shade voltou a morar com seu pai após o terrível incidente de Praia Perdida. No começo eles eram amigos. Ele visitava ela no hospital. Anos depois eles se aproximaram mais, foram a primeira vez um do outro, o término foi decisão de Shade, não Malik. Ele queria mais dela, mais comprometimento, mais transparência. Mas Shade gostava dos seus segredos. Sua privacidade, o controle sobre sua vida. Sua fixação. Agora Shade havia chegado a uma conclusão: hora de puxar o pino da granada, ou ascender o pavio. Sorte beneficia os corajosos. "Meu pai está fazendo um trabalho para o governo," Shade falou. "Tipo NASA? "Não exatamente. Como você é em manter segredos, Cruz?" "Eu sou uma criança gênero fluído que se fingia de homem hétero até seis meses atrás. Eu sei manter segredo." "É." Shade concordou, considerou, com uma expressão gentil no rosto para esconder que estava passando todos os possíveis cenários na sua cabeça. Ela me deve. Eu salvei ela. Ela não tem nenhum amigo. Ela vai topar. "Meu pai, bem, está rastreando o que eles estão chamando de OED— Objeto Espacial Desconhecido. Vários, na verdade. Sete, pra ser exata, OED-Dois até OED-Oito." Cruz levantou a sobrancelha. "O que aconteceu com OED-Um?" "Ele pousou na terra anos atrás. Eles acharam que os oitos OED's não pedaços de um meteoro maior ou planeta menor que explodiu, lançando eles pelo espaço. Um dos pedaços— OED-Um—entrou na roda gravitacional de Júpiter e chegou mais cedo que os outros. Dezenove anos antes. Os outros pegaram o caminho mais longo. Mas OED-Dois até Oito estão previstos para caírem na terra nas próximas semanas." Shade viu que Cruz ainda não havia feito a conexão, não havia entendido, o que deixou ela despontada. Mas então, com um clique, a expressão de Cruz mudou, "dezenove anos atrás? Não foi quando…" Shade concordou devagar. "Dezenove anos atrás. OED-Um entrou na órbita da terra e caiu em uma estação nuclear em Praia Perdida, Califórnia." Isso fez Cruz ficar paralisada. Seus olhos procurando alguma pista nos olhos de Shade Para ver se ela estava brincando. Porque isso não era um pequeno segredo, do tipo "Eu gosto de tal menino…" Esse era um segredo que duas meninas do ensino médio que acabaram de se conhecer não podiam saber. Cruz engoliu seco. "Você está falando da rocha alienígena?" "A rocha que mudou o mundo," Shade confirmou. "A rocha que reescreveu as leis da física. A rocha que transformou adolescentes em psicopatas poderosos. Essa rocha." "E você… você está falando que mais estão chegando?" "De acordo com os cálculos do meu pai, e ele é muito bom no seu trabalho. Ele está rastreando as rochas. Uma chega hoje na costa da Escócia. OED-Dois. OED-Três, chega alguns dias depois." Cruz mudou de posição, desconfortável, claramente percebendo que Shade não estava mais jogando conversa fora. Uma mensagem foi entregue. Uma questão estava no ar. "Era para cair. Iowa. Oh era," Shade falou. "Agora, com algumas mudanças, eles acham que vai cair em Nebraska. Todo o governo vai estar lá para pegar: Homeland, forças tarefas, alguns Rangers do exército, polícia vai levar todos os cientistas até lá, em Nebraska. O ar entre elas parecia vibrar. "Nebraska," Cruz falou. Shade concordou. "Uh-huh." Hora de acreditar nos seus instintos. "Mas a verdade é que vai cair em Iowa, como o cálculo original apontava. "Então…" "Então alguém mudou as coordenadas," Shade falou, sua voz baixa. "Alguém com acesso ao computador do meu pai. Ele é um gênio, mas sua memória é horrível. Ele anota suas senhas em um papel que guarda na gaveta." As expressões no rosto de Cruz eram fascinantes para Shade. Primeiro Cruz achou que estava ouvindo errado. E então, antes que ela pudesse perguntar, ela sabia que não estava. Cruz, Shade pensou que nunca poderia jogar poker, suas expressões eram fáceis de ler. "Você." Não era uma pergunta. "Eu sou muito boa em matemática." Shade falou. "Você mudou os cálculos do seu pai?" Shade confirmou. "A questão, Cruz, é porque eu mudei os números?" Era um teste, que Cruz passou, falando, "Você vai tentar pegar a rocha." "Não," Shade falou. "Eu não vou tentar. Eu vou conseguir." E depois de uma pausa ela adicionou, "especialmente se você me ajudar."

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